segunda-feira, 30 de junho de 2014

Está provada a nacionalidade de Deus

Aquela trave, à direita das cabines de rádio e TV, entrou para a história como aliada do futebol brasileiro.

Por Carlos Eduardo Leão*

Estou escrevendo, logo estou vivo. Sim, porque depois de Brasil x Chile sobreviver é mais um sinal da nacionalidade de Deus. Francisco é argentino mas Deus... Ah, esse é brasileiro! Aquela trave, à direita das cabines de rádio e TV, deveria ser levada para a nossa futura Catedral Cristo Rei. E Niemeyer, de onde estiver, há de inspirar os discípulos que o ajudaram no projeto para posicioná-la num lugar de destaque. Eu a colocaria no altar-mor, pois nela estão as impressões digitais da sagrada "la mano de Diós".

Talvez sejamos a nação mais exigente, mais dona da verdade e mais intransigente com as coisas do futebol. A impressão que se tem é que nascemos quase todos técnicos. Os outros poucos restantes nascem críticos ou comentaristas. Somos impiedosos com os que erram passes, violentos com os que perdem pênaltis, carrascos com os técnicos, impacientes com times em ascensão, intransigentes com as falhas individuais ou coletivas como se só nós existíssemos em campo ou como se fôssemos os invencíveis e infalíveis astros da bola.

A coisa é tão séria que, se conseguirmos o tão sonhado Hexa, os que nasceram críticos ou comentaristas de futebol hão de meter o pau na forma como Thiago Silva erguerá a Taça. Certamente criticarão a volta olímpica se for feita no sentido anti-horário sob a alegação de que a vida é pra frente e não um retrocesso como a forma escolhida para o desfile de verdadeiros campeões.

Dito isso, convido os que me leem para uma reflexão mais intimista, quase uma mea culpa em relação ao futebol e à nossa Seleção. Eu não queria estar no lugar deles. Embora sejam astros regiamente remunerados e com alguma experiência internacional, são, a maioria, meninos de vinte poucos anos sobre os quais colocamos toda a responsabilidade de uma conquista exigida por duzentos milhões. Eles são humanos, são igualmente brasileiros, têm suas famílias, pagam seus impostos, emocionam-se como nós, sofrem do mesmo modo e, bem ou mal, estão fazendo o seu melhor dentro de uma pressão estratosférica a eles imputada, principalmente pela mídia especializada, quase sempre impiedosa, tendenciosa, passional e, por essa máxima razão, pouco profissional.

Tenho minhas dúvidas se é realmente vantagem uma Copa do Mundo em casa. A não ser por um scratch fenomenal, bem treinado, competitivo e decisivo, o que não é o nosso caso, pode haver algum benefício, principalmente em relação à torcida. A nossa, diga-se de passagem, tem dado verdadeira demonstração de incompetência e perdendo de goleada para as rivais sul-americanas.

Musiquinhas cafonas, sonolentas aliadas a um refrão chocho de "O campeão voltou" não animam ninguém. E se pensarmos que somos o país do samba e carnaval, a nossa torcida está mais para charanga de várzea do que para o décimo segundo jogador que faria toda a diferença nas nossas arenas superfaturadas. No Mineirão, a coisa melhorou um pouquinho, mas longe do ideal.

A Seleção 2014 é uma das mais fraquinhas de nossa prodigiosa história. Mas é o que temos e cabe a nós incentivá-la. Imaginem o que se passa na cabeça de nossos jogadores. Copa do Mundo no Brasil e vinte e três homens defendendo a nossa honra, a nossa reputação, a nossa maior alegria. Embora abaixo da crítica, o jogo contra o Chile serviu para mostrar que nossos guerreiros superaram-se em garra, vontade e grande equilíbrio emocional na hora dos pênaltis. Por essa razão e pelas histórias de superação em outras Copas, como a Itália de 82, mantenho-me otimista e desejoso de ver o Brasil campeão do mundo.

Nem mesmo a certeza de que a derrota da Seleção seria decisiva para a mudança política que urge na nossa história me faria torcer contra ela. A importância da Seleção Brasileira de futebol na vida da nação faz com que ela se junte ao hino, à bandeira, ao brasão da república e ao selo nacional como o quinto símbolo pátrio. Certamente, a sua vitória nos renovará em patriotismo e nos dará força suficiente para a mais importante troca de pensamento político da história republicana.

Ao Hexa, Brasil! E a tudo de bom que ele nos trará!
*Carlos Eduardo Leão é médico e cronista.

Nenhum comentário:

Postar um comentário